Precisamos uns dos outros

Somos seres criados para a comunhão. A nossa interdependência é maior do que aquilo que pensamos ou mesmo que desejamos. Somos seres cuja vida depende de alguém que decidiu carregar-nos nove meses, e outros muitos mais decidiu, no amor, alimentar-nos, vestir-nos, dar-nos os medicamentos necessários, junto com o afecto que nos tornou o que somos hoje. O nosso Povo diz que “uma mão dá o pão e outra a criação”. Assim é. Não se trata sequer de ficarmos dependentes a vida toda em dimensões da nossa existência, mas da necessidade de criarmos consciência de que a auto-suficiência fecha-nos em nós mesmos, leva-nos a criar mofo interior e de que esta só nos isola e cria imagens falsas de nós próprios. É para a comunhão que fomos criados. O trigo que é pousado sobre a nossa mesa foi algures semeado, colhido, triturado, misturado com água e sal, levedado, colocado no forno… e chegou até nós. Quantas mãos tocaram uns simples grãos de trigo até que ele se fizesse vida em nós! Uma mão precisa da outra para lavar o rosto, pois uma sozinha torna-se num esforço medonho; uma perna a suportar o peso do corpo cansa-se mais rápido do que se forem as duas a valer-se em conjunto. A comunhão é o ponto de partida e o ponto de chegada da nossa existência. Um ser não anula o outro mas antes o pode complementar. Não sabemos tudo e o que sabemos é tão pouco; o mesmo acontecimento, quando observado por diferentes pessoas, pode oferecer-nos uma leitura mais ampla da realidade; a contemplação do mesmo pôr-do-sol oferece perspectivas diferentes da grandeza da criação. Precisamos uns dos outros. E isso traz-nos a responsabilidade de criarmos disponibilidade em nós e a certeza de que a vida vale mais sendo em comunhão! E isso só pode ser bom. (© iMissio)

O Espírito Santo continua a fazer das Suas!

O Espírito Santo continua a fazer das Suas. Continua a soprar por entre as vidas de todos e dinamiza-as num amor inexplicável. Dá a experimentar o amor que comove no silêncio. Dá a conhecer o amor que nos faz sorrir sem ter a necessidade de Se expressar. Dá a oportunidade de nos arrepiarmos com o amor que surge com a Palavra da Sua ação. Dá-nos a graça de recebermos o amor que nos desinstala por completo com a simplicidade de um olhar. Dá-nos a sorte de nos sentirmos tremendamente amados em abraços que restauram todos os nossos pedaços. O Espírito Santo continua a fazer das Suas. Insiste em sair por entre rajadas de ventania divina pronto a trocar-nos as voltas por entre as voltas da nossa vida. Está sempre preparado a colocar-nos do avesso para que possamos estar, verdadeiramente, de frente para nós e para Si. Coloca-nos em busca das nossas incertezas tornando-nos sedentos do que não vemos e não conseguimos explicar. Faz de nós peregrinos de todas as moradas e momentos. Faz de nós sonhadores alargando-nos o nosso céu. O Espírito continua a fazer das Suas. Vai sustentando o insustentável. Vai moldando o que já foi despedaçado. Vai incentivando o que se deixou perder por entre becos sem saída e oferece-Se como a verdadeira saída. Vai escancarando as portas da nossa humanidade dando a conhecer a Sua divindade em arrepios que nos dão a saborear a certeza da Sua presença. O Espírito Santo continua a fazer das Suas. E vai manifestando-Se em sorrisos e lágrimas. Em dom da palavra e em silêncios comovedores. O Espírito Santo vai enchendo o nosso nada e relembra-nos que o nosso pouco é, aos olhos do Senhor da Vida, o Seu tudo. O Espírito Santo hoje, sem menos espetáculo com línguas de fogo, continua a incendiar-nos e torna-nos em poliglotas do Seu amor. O Espírito Santo continua a fazer das Suas. Continua a chamar por quem se dizia esquecido e continua a contar com quem não conta. O Espírito Santo continua a fazer das Suas: a possibilitar que não sejamos causas impossíveis! (© iMissio, 2019)

O século XXI é a era do vale tudo?

Cada vez é mais difícil mover o coração de alguém. As pessoas têm as portas e janelas fechadas de tal modo que nem o vento pode andar pelos corredores do seu íntimo. Talvez por mágoas acumuladas, demasiadas adversidades, pouco descanso, desejos mal alimentados, esperanças de que tudo mude num instante por milagre, são muitas as possíveis causas que podem levar alguém a um estado de vida interior quase vegetativo. O que acontece na prática é que há uma multidão enorme de gente para quem tudo é igual. Não há grandes valores nem razão para que haja. O único critério que preside às escolhas que fazem na vida é o seu, com balanças, pesos e medidas muito pessoais. Os outros são isso mesmo: outros, que nada têm a ver com a minha vida, que, aliás, é minha e só minha. Assim sendo, julgam, podem fazer o que lhes parecer bem, tudo tem valor desde que considerem isso. Para estas pessoas, enganar, trair ou dizer a verdade é apenas uma questão de perspetiva, portanto o valor depende apenas de quem julga. Tudo é relativo. Parece mesmo que o século XXI é a era do vale tudo. Ou do nada vale. Claro que a cada momento se considera que isto é melhor do que aquilo, mas no dia seguinte já podem ser iguais ou de valor inverso… afinal, a coerência também é algo com valor muito relativo para estas pessoas. Não importa a quem pensa assim que tal se trate de um erro absoluto, do princípio ao fim. Nesta nossa vida, muito pouco é relativo. A existência de cada um de nós é um mistério que nos ultrapassa por completo, ao ponto de muitos o tomarem como algo que não importa explorar. Nesta nossa vida, muito depende das relações que criamos e mantemos com o outro. Como se sem o outro eu nunca consiga ser eu. Seria muito melhor que não nos considerássemos deuses capazes de decidir sobre o valor de tudo. Que bom seria também que nos mantivéssemos atentos aos outros e ao que nos podem ensinar e ajudar. Alguns, pelo seu exemplo de alegria profunda apesar de tudo, outros talvez pelas suas más escolhas, boas intenções fracassadas, remorsos e arrependimentos, consciência pesada ou perdida… O fundamental é a humildade de abrir o coração ao mundo e aos outros, aos mares e ao céu, mantendo sempre bem viva a esperança de que amanhã pode mesmo ser o melhor dia da nossa vida. Se não esperas nada da vida, porque acreditas que nada te pode surpreender porque já sabes tudo, então já morreste e o que pensas e sentes são apenas sombras. É bom sentir o vento passear nas escadas e corredores do nosso coração. Por onde também passam os que lá convidámos a viver. (© iMissio, 2019)

Passar ao lado da vida

Passei-lhes ao lado, cuidadosamente, para não me sujar… Mais abaixo, um homem lá soprava, com a máquina, as folhas que se amontoavam no meio do passeio para alguém de seguida as recolher. Passei-lhes ao lado, cuidadosamente, para não me sujar… E pus-me a pensar que também nós, quantas vezes ficamos amontoados em problemas ou chatices que parecem não ter resolução. Passei-lhes ao lado, cuidadosamente, para não me sujar… Quem sabe nos falta apenas a coragem de olhar de frente e saber limpar as nossas avenidas e ruas interiores, sem soprar as folhas e deixá-las amontoadas, mas arrumá-las no lugar que lhes pertence. Não passemos ao lado dos pedaços de vida que nos compete arrumar, bem arrumados. E assim as nossas avenidas e ruas interiores estarão mais limpas e abertas para que outras vidas passem por nós, mas não passem ao lado. (© iMissio, 2019)

Hoje já não há tempo para nada

Anda o mundo cheio de pressa, o dia a dia é uma sequência de urgências sem fim. A ilusão mais comum é que chegará um momento na nossa vida futura em que teremos tempo para tratar do essencial. Mais do que uma fantasia, esse é um erro grave. A vida deve ser vivida de uma forma em que nunca se adie o importante, caso contrário não é vida, apenas um adiamento constante, uma sobrevivência arrastada. Se não estivermos atentos, a monotonia pega-nos ao colo e embala-nos até adormecermos… durante anos. Espera-se que tudo se alinhe à nossa volta e, sem termos de fazer nada, o mundo nos entregue nas mãos o que julgamos merecer. Esta esperança imbecil revela que nos consideramos incapazes até mesmo de lutar pela nossa felicidade. Quantos de nós deixaram de viver quando deixaram a infância para trás? Ensinaram-nos que é preciso ter coisas para ser feliz. Mas não é. Aprendemos, à força, a deixar os sonhos a asfixiar debaixo das almofadas onde foram criados, numa espécie de velório sem fim da vontade íntima de sermos felizes. É preciso parar. Parar de andar de um lado para outro, sem ir a lado nenhum. Importa descansar, sem sentir culpa porque se abandonou a roda viva de tanta gente que, na verdade, não vive. Temos tempo. O nosso tempo está todo disponível. O futuro aguarda pelas nossas escolhas e ordens. A prova é que, quando acontece uma desgraça séria, tudo muda com facilidade, alteramos objetivos diários, modificamos rotinas, deixamos de querer coisas supérfluas e encontramos forças para tudo isto e para o que mais for necessário, dentro de nós, onde nunca nos havíamos arriscado a explorar com tempo… por medo de faltar a uma qualquer urgência sem importância. Será mesmo precisa uma infelicidade grave para que a minha vida se torne mais verdadeira? (© iMissio, 2019.)