II Domingo da Quaresma

A Palavra de Deus do II Domingo da Quaresma fala-nos da fidelidade e obediência de Abraão (1ª Leitura), do incomensurável amor de Deus (2ª Leitura) e da Ressurreição, o principal fundamento da fé e esperança cristã.

I Leitura (Gen 22, 1-2.9-13.15-18)
A primeira Leitura, retirada dos textos de tradição patriarcal do Livro de Génesis, relata-nos o episódio em que Deus pede a Abraão para oferecer o seu próprio filho em sacrifício.
Este estranho pedido, que certamente nos escandaliza, deve ser vista à luz uma tradição cultual praticada por alguns povos antigos, pela qual eram oferecidos sacrifícios humanos para prestar culto aos deuses. O autor desta passagem bíblica baseou-se nessa tradição, não para relatar simplesmente um acontecimento, mas fundamentalmente para com ela fazer uma catequese sobre a confiança e obediência a Deus.
Abraão, a quem o Senhor tinha já pedido para abandonar a sua terra e a sua família, é colocado novamente perante uma prova bem difícil: oferecer o seu único filho em sacrifício. Abraão é colocado perante o dilema de sacrificar o seu filho ou deixar de confiar em Deus e nas suas promessas. Como em circunstâncias anteriores, ele aceitou e confiou plenamente na proposta do Senhor, mas esta não se concretizou porque, através da voz de um Anjo, Deus interveio e não permitiu que tal  acontecesse.
E pelo facto de Abraão ter escutado e aceitado o que lhe foi pedido, Deus abençoou-o e prometeu que na sua descendência serão abençoados todos os povos.
A fé e a obediência à vontade de Deus fizeram de Abraão “o pai de todos os crentes”, o modelo a seguir por todos aqueles que, nos bons e maus momentos da sua vida, ousam escutar as propostas de Deus e aceitar, sem hesitações, a Sua vontade.

II Leitura (Rom 8, 31-34)
A segunda Leitura apresenta-nos, de forma reduzida, o hino de Paulo ao amor que Deus tem por nós e que manifestou em seu Filho, Jesus Cristo.
Deus não poupou o seu próprio Filho, mas entregou-O à morte por todos nós. Com a sua morte, Cristo reconstruiu a união com Deus quebrada pelo pecado e restabeleceu, agora definitivamente, a Aliança entre Deus e toda a humanidade.
Esta prova do amor profundo de Deus, que nada nem ninguém podem apagar, dá-nos a certeza de que Ele está por nós, haja o que houver. De facto, se o único que nos podia condenar, nos amou e justificou, não haverá mesmo nenhuma vontade ou obstáculo que possam interferir no grande amor de Deus por todos nós.
E acreditar neste amor é confiar e entregar-se a Deus, pois “Se Deus está por nós, quem estará contra nós?”

Evangelho (Mac 9, 2-10)
A passagem de hoje pode ser melhor entendida se considerarmos os trechos que a precedem (8, 31-33), principalmente aquele em que Jesus, na caminhada para Jerusalém, faz o primeiro anúncio da sua Paixão e Morte.
Nessa altura, os discípulos ficaram desanimados e frustrados, porquanto o que ouviram não correspondia às expectativas criadas (eles esperavam um Messias poderoso, de glória e triunfos e não um Servo sofredor que morre na cruz).
Então, tomando Pedro, Tiago e João, Jesus subiu ao monte, lugar simbólico de encontro com Deus, para manifestar a sua glória e anunciar a sua vitória sobre a morte.
A cena da transfiguração de Jesus tem as características próprias de uma Teofania, ou seja, uma manifestação de Deus através de sinais e fenómenos extraordinários. A cor resplandecente das vestes de Jesus, sinal da ressurreição e da glória de Deus, a presença de Moisés e de Elias, dois personagens importantes da história do povo de Israel, que representavam a Lei e os Profetas, a nuvem, que simboliza a presença de Deus, e a voz que vem do céu, pela qual o próprio Deus dirige a Palavra aos três discípulos, são os sinais que revelam a verdadeira identidade de Jesus: Ele é verdadeiramente Deus, Ele é o Messias anunciado por Moisés e pelos profetas, Ele é “o meu Filho muito amado: escutai-O”.
Esta mensagem de Deus dirige-se aos discípulos, representados por Pedro, Tiago e João, e tem o objetivo de demonstrar a glória de Jesus e a sua identidade, certificando que Ele é verdadeiramente o Filho amado de Deus, no qual será concretizado o projeto salvador do Pai em favor dos homens, através da entrega total de si próprio por amor.
Jesus leva ao monte os três discípulos para os fazer entender a sua morte e ressurreição, contudo, eles não compreenderam o verdadeiro significado do que tinham presenciado. Por isso, eles não quiseram descer do monte, quiseram deter-se naquele momento e não fazer o caminho de dor e sofrimento anunciado por Jesus.
Este texto evangélico demonstra que o fim do caminho de Jesus não será a cruz, mas a ressurreição, o que nos garante que esse também será o nosso fim. No entanto, temos de entender que é necessário passar, como Jesus, por muitas provações para alcançar o final o caminho. Não há ressurreição sem Paixão.
Este tempo quaresmal é um momento propício para efectuarmos a nossa experiência de “transfiguração”: subir ao monte com Jesus, ouvir atentamente a voz de Deus e deixar que o Espírito transforme as nossas vidas.

II DOMINGO DA QUARESMA